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O avanço da doença de Chagas

27 de junho de 2012
 
WANDERLEY DE SOUZA
 
Os avanços ocorridos nas ciências biomédicas têm permitido a prevenção ou o tratamento de uma série de doenças. No campo das chamadas doenças parasitárias, eles são mais lentos ou mesmo inexistentes, apesar de continuarem causando alguns milhões de mortes por ano em todo o mundo. No caso destas doenças, genericamente conhecidas como "negligenciadas" em face de serem colocadas em plano secundário pelas empresas farmacêuticas, por atingirem populações pobres, os avanços decorrem muito mais de melhorias no controle da transmissão, sobretudo nas doenças transmitidas por insetos, do que do combate direto ao agente parasitário. Esta é a situação de doenças como a malária e a doença de Chagas. No caso da doença de Chagas, de certa forma símbolo de momentos importantes na história da medicina brasileira, os programas de controle tiveram grande sucesso. Realmente, é cada vez mais raro encontrarmos casos agudos da doença de Chagas em hospitais das grandes cidades nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste do Brasil. No entanto, vem aumentando significativamente o número de casos encontrados na região Norte, sobretudo na região amazônica.
 
Apenas em 1941 foi feita a primeira descrição da existência da doença de Chagas na região amazônica, na Guiana Francesa. Na Amazônia brasileira, os primeiros casos foram descritos por colegas do Instituto Evandro Chagas, no Pará, somente em 1969. Inicialmente, casos raros. Mais recentemente, no entanto, os dados sorológicos apontam para prevalência da doença variando entre 4,5% a 13% da população estudada, com o aparecimento de infecções agudas e que levam à morte em um número crescente de pacientes. Apenas o grupo de pesquisadores de Belém relatou 761 casos em um período de dez anos. O grupo coordenado por José Rodrigues Coura, da Fiocruz, vem realizando um estudo aprofundado sobre o tema na região amazônica. Pelo que foi publicado até o momento, tudo indica que o número de infectados tende a aumentar à medida que mais grupos de investigadores se dedicam ao tema.
 
No estudo da doença de Chagas, aprendemos que a principal fonte de transmissão é aquela resultante da ação do inseto dentro da residência durante o ato de se alimentar. Outras formas de transmissão, como a transplacentária, da mãe para o feto, ou por transfusão de sangue e mesmo em transplante de órgãos, são também importantes. Na região amazônica, vamos encontrar duas novas modalidades de transmissão. Na primeira, o inseto vetor pica o homem à medida que ele entra na floresta em busca da palha da piaçava, palmeira encontrada em grandes áreas do alto e médio Rio Negro. Neste ambiente, pode-se encontrar 27 espécies de insetos transmissores que convivem com 33 espécies de mamíferos que estão infectados pelo protozoário transmissor, o Trypanosoma cruzi, estabelecendo assim um ciclo zoonótico da doença. O homem é infectado à medida que passa a fazer parte deste ambiente na sua atividade laboral. Neste sentido, podemos mesmo considerar que, em boa parte, a doença de Chagas na Amazônia é uma doença ocupacional. A segunda fonte de transmissão seria a infecção por via oral, através do consumo de suco de frutas, como o açaí na Amazônia brasileira e a goiaba na Amazônia colombiana. Nestes casos, o que ocorre é a presença de insetos infectados junto às frutas e seu esmagamento no ato de preparar o suco, liberando do seu tubo digestivo centenas de formas infectivas. Dados iniciais indicam que, nestes casos, é possível encontrar um número de protozoários maior do que aquele existente nas fezes de um inseto, o que explicaria o grande número de casos agudos, extremamente graves, muitas vezes levando à morte dos pacientes.
 
Ainda estamos longe de dominar todos os aspectos da doença de Chagas. É sempre oportuno lembrar que ela foi descoberta no Brasil por Carlos Chagas e vem sendo objeto de estudos por muitos pesquisadores brasileiros que atuam nas mais diferentes áreas do conhecimento, da biologia básica ao tratamento e a epidemiologia. Esta rede de pesquisadores é reconhecida pelo mérito do trabalho realizado, contribuindo para que a parasitologia brasileira ocupe a segunda posição mundial em produtividade científica. Logo, é fundamental que as agências de apoio à pesquisa científica no Brasil continuem incentivando projetos nesta área.
 

WANDERLEY DE SOUZA é professor da UFRJ e diretor do Inmetro.

 

Fonte: O globo



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