Um sistema integrado que reuna todos os avanços na pesquisa em saúde. Essa é a proposta de José Salm, professor da Universidade do Estado de Santa Catarina, e Robert Terry, da Organização Mundial da Saúde (OMS), detalhada em um artigo publicado na edição de hoje da revista Science. O texto faz parte de um especial sobre os maiores desafios para o bem-estar global listados por especialistas de várias partes do mundo. Uma primeira parte dos trabalhos foi divulgada na edição de ontem da Science Translational Medicine, publicação do mesmo grupo, e envolve abordagens para problemas como morte de recém-nascidos, desordens psiquiátricas e dificuldade de acesso a imunizações.
Segundo Salm, a integração de informações se torna ainda mais essencial no atual momento, em que investidores tentam se levantar da crise econômica. Se a situação dos países com mais condições de financiar pesquisa é difícil, a das nações pobres é muito pior. A ferramenta amenizaria essa dificuldade fornecendo informações que otimizassem o uso dos já escassos recursos. "O sistema vai disponibilizar o resultado de pesquisas, o que poupará os países mais pobres de investir em estudos iguais. Eles não precisarão repetir um experimento, esse seria o benefício geral", assegura Salm, também pesquisador do Instituto Stela, organização sem fins lucrativos em Florianópolis
Os Estados-membros da OMS também já reforçaram a necessidade de um observatório global. Eles solicitaram, em conjunto, à agência da Organização das Nações Unidas (ONU) a elaboração de um mapa universal dos avanços na saúde. "As informações seriam essenciais para o desenvolvimento de pesquisas de doenças tropicais ou negligenciadas, como a de chagas, em que não há interesse da industria farmacêutica porque as pesquisas são caras e a quantidade de pessoas atendidas pela droga é baixa", diz Salm.
Escassez sanitária
Em outro artigo do especial, Melinda Gates, da Bill & Melinda Gates Foundation, nos Estados Unidos, aponta que a saúde dos países em desenvolvimento aumentaria se mulheres e meninas fossem o foco de atenção dos governos. Em outra perspectiva, Deb Niemeier, da Universidade da Califórnia (EUA), discute a escassez de serviços sanitários básicos em diversos países. Um dado curioso é que a maior parte da população mundial tem mais acesso a telefones celulares do que a banheiros.
Aproximadamente 768 milhões de pessoas não têm água potável; 2,5 bilhões carecem de saneamento básico e 1 bilhão defeca ao ar livre. Mais de 50% dessa população vive em países de renda média. "O uso desses serviços faz a diferença entre a vida e a morte. A diarreia, doença em que 90% dos casos estão relacionados com a acesso inadequado à água potável e ao saneamento, mata mais crianças menores de 5 anos que a Aids, a malária e o sarampo juntos", diz a engenheira. (IO)
Palavra de especialista
Exemplo para os norte-americanos
"Nossa proposta é que seja elaborada uma ferramenta com tecnologia de ponta que reuna diferentes fontes de informação e pesquisas em saúde. Eu cheguei a esse projeto porque ajudei a criar o currículo Lattes, que padroniza as informações de ciência e tecnologia. Tive a oportunidade de, em 2010, apoiar o governo dos Estados Unidos na elaboração de uma estrutura parecida com a nosso sistema. A primeira declaração de uma das diretoras foi a de que eles estavam 10 anos atrás do Brasil quando o assunto era educação unificada nacional. O modelo do observatório está claro, mas iremos discuti-lo novamente em um fórum mundial em Berlim, em novembro. A expectativa é implementá-lo a partir do ano que vem. Um dos maiores desafios é a questão da língua, que deve ser variada, já que os países membros da OMS exigem que a informação esteja disponível em vários idiomas. O custo inicial será de US$ 11,5 milhões. Mas o valor vale o benefício. Pesquisas feitas no Canadá poderão ser aplicadas na África e na Ásia, por exemplo, reduzindo gastos e promovendo a saúde em países dessas regiões."
José Salm, professor da Universidade do Estado de Santa Catarina