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Na teoria, exemplo mundial. Na prática...

20 de fevereiro de 2014
 
Governo levará sugestão à Convenção do Cairo, que define princípios de convivência em sociedade, mostrando que o país tem conseguido gerenciar o respeito às minorias. Especialistas destacam a distância entre a realidade e o discurso
 
ÉTORE MEDEIROS
 
O governo define a partir de hoje, em Brasília, os últimos detalhes sobre as pautas que defenderá durante a revisão da Convenção do Cairo sobre população e desenvolvimento. Formulado por 179 países, em 1994, o documento é uma espécie de carta de princípios sobre planejamento familiar, imigração, crescimento sustentável da população e igualdade entre os gêneros. Na Cairo+20, que acontecerá em abril, em Nova York, os debates devem se concentrar nos direitos sexuais e no empoderamento das mulheres. Temas como o racismo, a homofobia e a erradicação da pobreza também estarão presentes.
 
A superpopulação, um dos temas do encontro, não é problema para o Brasil. Apesar de uma em cada cinco gestantes ter menos de 20 anos de idade, o número de filhos por mulher no país caiu a níveis considerados adequados (veja quadro). Ao defender uma pauta considerada progressista no respeito aos direitos humanos, o discurso do governo brasileiro se afasta da realidade. Levantamento do Grupo Gay da Bahia aponta que, em 2013, um gay, lésbica ou travesti foi assassinado a cada 28 horas. Na Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), 425 processos foram abertos no ano passado para investigar denúncias de racismo -- crime que, na internet, foi praticado em mais de 12 mil páginas, segundo a ONG Safernet.
 
Tânia Navarro Swain, professora de história e de estudos feministas da Universidade de Brasília (UnB), ressalta as diferenças entre o discurso e a realidade. "O Brasil apresenta uma vitrine, mas, quando as pessoas vem para cá, percebem que as coisas são diferentes. Não adianta dizer que somos a vanguarda: temos marcos legislativos e regulatórios, mas que não são eficazes". Richarlls Martins, representante do Conselho Nacional de Saúde na Comissão Nacional de População e Desenvolvimento (CNPD), reconhece avanços na criação da Seppir, mas considera que "eles se dão muito devagar para a necessidade de desenvolvimento". "Avançamos na igualdade racial, temos uma lei no qual racismo é crime hediondo, mas quantas pessoas foram presas por racismo?", questiona.
 
Jacqueline Pitanguy, coordenadora executiva da ONG Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação (Cepia), vê dificuldades também para a implementação do direito de aborto -- legalizado no Brasil em casos de estupro, de riscos à vida da gestante e de fetos anencéfalos. "Temos um número muito pequeno, cerca de 60 hospitais que efetivamente atendem a mulheres que, por estupro, venham a engravidar e que têm o direito de realizar o abortamento."
 
O contexto internacional, que repercute no Brasil, pode ser desfavorável para que a Cairo+20 apresente avanços significativos. "O grande desafio, em geral, é a falta de separação entre Estado e igrejas, no que se refere às políticas públicas e legislações referentes aos direitos reprodutivos e sexuais", explica Pitanguy. Apesar de ter aprovado a união estável homoafetiva, o país também foi palco de manifestações contrárias ao Projeto de Lei 122, de 2006, que criminaliza a homofobia. A proposta dorme esquecida no Congresso Nacional, pressionada por setores religiosos com ampla representação parlamentar.
 
Vanguarda
 
"O Brasil tem conseguido, de uma maneira reconhecida internacionalmente, ser capaz de gerenciar esse respeito aos direitos humanos de todos os grupos minoritários, ao mesmo tempo em que tem uma democracia forte e atuante", define Ricardo Paes de Barros, presidente da CNPD. Segundo ele, "o Brasil continua na vanguarda" na área. "A declaração de Montevidéu, alcançada no ano passado, é bastante avançada e é a posição que o Brasil levará, em abril, a Nova York." O documento defende, entre outros pontos, a educação laica, a eliminação do aborto inseguro por meio da educação sexual e a igualdade de gênero.
 
Os números no país
 
Número de filhos por mulher:
 
1960: 6,28
 
1980: 4,35
 
2000: 2,38
 
2009: 1,94
 
Faixa etária da gestante (2011):
 
Menos de 15 anos: 0,77%
 
15 a 19 anos: 17,64%
 
20 a 24 anos: 26,68%
 
25 a 29 anos: 25,04%
 
Mais de 30 anos: 29,87%
 
312 -- número de gays, lésbicas e travestis assassinados no Brasil em 2013, de acordo com o levantamento anual do Grupo Gay da Bahia -- um homicídio a cada 28 horas.
 
425 -- número de processos de racismo abertos pela Ouvidoria da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial
 
Fonte: Séries históricas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
 
Três perguntas para
 
Ricardo Paes de Barros, presidente da Comissão Nacional de População e Desenvolvimento e subsecretário de Ações Estratégicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República Como o Brasil pensa estrategicamente o tamanho da população?
 
Um pouco antes de Cairo, as sociedades tinham uma preocupação com o tamanho das populações, como se a sociedade em geral pudesse ter uma preferência sobre um número de pessoas em um dado país. A posição brasileira é garantir os direitos sexuais e reprodutivos, a informação, a orientação e depois pensar se tem alguma coisa que está fazendo com que essas decisões responsáveis e soberanas individuais estejam levando ao que seria ótimo para a sociedade. Nos países que, como o Brasil, trabalharam em garantir esses direitos, a população parou de crescer de uma maneira acelerada e mudou para um ritmo razoável.
 
Qual o papel do Brasil e quais pautas serão levadas para o centro do debate em Nova York, em abril, durante a Cairo+20?
 
Alguns países, em certo sentido, são impulsionados pelas conferências, e outros, as impulsionam, como o Brasil. As questões mais tensionadas a nível mundial são o empoderamento da mulher e a questão do reconhecimento dos direitos sexuais e da saúde sexual. (A Convenção do) Cairo reconhece muito a questão dos direitos reprodutivos e da saúde reprodutiva, mas não dá um status adequado, acreditamos, para os direitos sexuais e para a saúde sexual.
 
Qual a expectativa em relação à recepção das ideias brasileiras por outros países?
 
Temos uma reunião com os países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), onde vamos discutir exatamente as questões de população e desenvolvimento e como levar isso a Nova York. Tentaremos, nessa reunião, ser mais convincentes que os nossos parceiros russos e chineses sobre os avanços que são necessários. A posição brasileira e o sonho latino-americano é que os avanços que foram possíveis de ser incorporados na conferência regional de Montevideu, por absoluto consenso, sejam adotados em Nova York. Em que medida isso vai ser possível, neste momento, é muito difícil de apostar.
 
Fonte: Correio Braziliense


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